Uma mulher de Paulista, no Grande Recife, conseguiu na Justiça o direito de receber da União uma indenização no valor de R$ 50 mil por reparação pela morte do marido. Ele foi um dos primeiros profissionais de saúde a morrer de Covid-19 no estado, após contrair a doença enquanto trabalhava em dois hospitais do Recife, em abril de 2020.
“Espero que essa decisão possa ajudar outras pessoas que vieram a sofrer pela perda de seus entes queridos”, disse, em entrevista ao g1, a costureira e ex-técnica de enfermagem Andreia Rodrigues dos Santos, de 50 anos, que moveu a ação na justiça.
A sentença foi proferida na segunda-feira (6) pelo juiz substituto da 15ª Vara Federal de Pernambuco, Jaime Travassos Sarinho. A decisão teve como base a lei 14.128, de 26 de março de 2021, que estabelece uma compensação financeira aos trabalhadores da saúde afetados pela pandemia.
A norma contempla profissionais que tenham falecido ou sido considerados permanentemente incapazes para o trabalho por se contaminarem no atendimento ao público durante a crise sanitária. Nos casos de morte, a indenização é concedida ao cônjuge ou companheiro da pessoa.
Na sentença, o juiz estipula que o pagamento seja feito em parcela única. A União tem 30 dias para apresentar algum recurso.
Com formação técnica em enfermagem, Andreia deixou a profissão depois que o marido, Egrenaldo Felipe dos Santos morreu, aos 46 anos, no dia 20 de abril de 2020, pouco mais de um mês após o registro dos primeiros casos de Covid-19 em Pernambuco.
Naquela data, o estado registrava 1.064 casos confirmados entre profissionais de saúde até então, segundo boletim da Secretaria de Saúde. Não havia o recorte de falecimentos para esse público, mas naquele momento tinham sido registrados 260 óbitos por Covid-19 em Pernambuco.
Egrenaldo, que também era técnico de enfermagem, trabalhava em duas unidades de saúde do Recife: o Hospital Universitário Oswaldo Cruz (Huoc) e o Hospital das Clínicas da Universidade Federal de Pernambuco (HC-UFPE).
“Nas duas instituições, ele atendia pacientes de Covid-19. Trabalhou muito, praticamente 24 horas. De dia, ia para o HC e à noite, para o Oswaldo. Quando ele faleceu, eu nem voltei mais à empresa onde eu trabalhava”, conta Andreia, que era funcionária de uma clínica especializada em procedimentos de hemodiálise.
De acordo com ela, o marido começou a sentir os sintomas uma semana antes de morrer. Primeiro, ele foi afastado e ficou em isolamento em casa por sete dias. No oitavo, passou mal de madrugada, sendo levado para uma clínica particular em Olinda, onde faleceu no fim da tarde.
Andreia e Egrenaldo estavam casados há 23 anos e tiveram uma filha. O neto, de 2 anos, veio depois da morte do marido.
“Ele foi meu primeiro namorado e eu fui a primeira dele. Somando tudo, com os 11 de namoro e noivado, ficamos juntos por 34 anos”, lembra a ex-técnica de enfermagem, que se sustenta do trabalho como costureira e da pensão que recebe do INSS, por ser viúva de Egrenaldo.
Morando até hoje na casa onde vivia como esposo, em Maranguape I, Paulista, Andreia se emociona quando fala sobre o assunto.
“O valor material não compensa a dor da perda, mas a indenização vai me ajudar muito e é uma forma de fazer uma reparação pela privação de viver ao lado dele. Ainda estou me adaptando a essa perda”, afirma.
Pouca jurisprudência
No Brasil, há pouca jurisprudência sobre o assunto. Em outubro de 2022, uma cozinheira de uma maternidade do Mato Grosso conseguiu a indenização após ser infectada pela Covid-19, considerada hoje uma doença ocupacional.
“A lei é muito taxativa e muitas famílias não têm conhecimento [da norma]. E outras, que sabem, não acreditam muito que podem conseguir a indenização”, diz a advogada Natália Araújo, que representou Andreia.